fevereiro 17, 2011

Reforma política brasileira: o que nos diria Aristóteles?

Por que reformar o sistema político brasileiro? Esta pergunta é perfeitamente cabível porque o sistema político brasileiro está funcionando bastante bem, sob vários aspectos importantes. De fato, nenhum direito individual encontra-se ameaçado e nenhuma lei é aprovada em desafio à vontade do povo, assim como a governabilidade vem sendo assegurada por coalizões majoritárias que apoiam, com a devida dose de crítica, as iniciativas do presidente e dos governadores. Além disso, os mandatos executivos são limitados e o correto exercício do poder é vigiado, não só pelos legislativos, mas também por outras instituições, como os tribunais de contas, o ministério público, o conselho de justiça e – ‘last but not least’ – a polícia federal.

Dois aspectos do sistema parecem, porém, incomodar profundamente os eleitores brasileiros.
Um é o processo eleitoral por votação proporcional com lista livre, que permite a eleição
de candidatos menos votados e dentre eles alguns claramente preteridos pelos eleitores -
problema que se agrava com a permissão a coalizões partidárias. Outro é a ausência de regras restritivas aos benefícios que os legisladores podem votar em seu favor. Um terceiro aspecto poderia ser incluído em nossas preocupações, embora não tenha (ainda) excitado a ira dos eleitores: a total ausência de regras constitucionais ao excesso de taxação e gastos do governo federal.

Os partidos políticos, entretanto, não querem saber de limitações aos seus benefícios e
parecem divididos a respeito da reforma do sistema eleitoral. O PT, ao propor a manutenção
do atual sistema, porém com lista fechada, deixa claro que seu objetivo é manter férreo controle sobre a escolha dos candidatos do partido. Os partidos menores hoje aliados ao PT
não querem saber de grandes mudanças, insistindo em manter toda a flexibilidade atual para a
montagem de coalizões eleitorais e mudanças de partido pelos candidatos eleitos. A oposição
fala em mudar o sistema para distrital majoritário, semelhante ao dos EUA. Enquanto isso, o
PMDB propõe transformar os estados em grandes distritos eleitorais majoritários, elegendo
os candidatos mais votados, independentemente dos partidos. Nestas circunstâncias, é difícil
acreditar em qualquer reforma no curto prazo.

Uma consideração importante me parece pairar acima desses problemas, quando avaliamos
o nosso sistema político: a necessidade de se melhorar a qualidade de nossa representação
política. A lei da ficha limpa é um primeiro e mínimo passo - essencial, mas não suficiente -
nessa direção. Outros passos precisam ser considerados.

Aristóteles já dizia que um sistema político ideal deve conter uma dose de monarquia, outra de
aristocracia e uma terceira de democracia. Monarquia para ele equivalia à necessária dose de
poder executivo para que o governo possa cumprir corretamente suas funções. Aristocracia
significava a dose de poder que é desejável reservar aos elementos da sociedade distinguidos por suas qualidades e realizações. A dose de democracia assegurava a devida consideração aos interesses do povo em geral. Parafraseando-o, a mim parece que nos falta a desejável dose de mérito.

Continuamos.

3 comentários:

Anônimo disse...

Concordo plenamente quanto a "faltar a dose desejável de mérito". Boa parte do povo parece não valorizar a capacidade adquirida de uma pessoa, mas sim a identificação popular com canditatos pífios e sem o mínimo discernimento... Mas bem, considerando o ex-presidente que tínhamos e por várias vezes demonstrou não ver médicos e engenheiros (por exemplo) como trabalhadores e dignos e legítimos representantes da pátria, penso que infelizmente o Brasil não se importa com a meritocracia e que dificilmente esta será devidamente considerada...
Quanto ao Ficha Limpa, será ótimo que não concedam recursos e mais recursos aos por ela impedidos de se elegerem e que a Lei consiga funcionar plenamente...

Thaís Gualberto disse...

Concordo plenamente quanto a "faltar a dose desejável de mérito". Boa parte do povo parece não valorizar a capacidade adquirida de uma pessoa, mas sim a identificação popular com canditatos pífios e sem o mínimo discernimento... Mas bem, considerando o ex-presidente que tínhamos e por várias vezes demonstrou não ver médicos e engenheiros (por exemplo) como trabalhadores e dignos e legítimos representantes da pátria, penso que infelizmente o Brasil não se importa com a meritocracia e que dificilmente esta será devidamente considerada...
Quanto ao Ficha Limpa, será ótimo que não concedam recursos e mais recursos aos por ela impedidos de se elegerem e que a Lei consiga funcionar plenamente... (Fui eu quem fiz o anônimo, sem querer. Agradeço se puder deletá-lo.)

Fabiano Pegurier disse...

Thaís,
Não se desespere: o comportamento político de qualquer sociedade custa a mudar, mas acaba mudando. Ã medida que ficarmos mais informados e experientes na prática da política, vamos nos tornar mais exigentes e fazer questão de mais meritocracia na pollítica. E a Lei da Ficha Limpa vai funcionar, se não para esta última eleição, ao menos para a próxima e todas as seguintes.